O STJ definiu os critérios que a Justiça deve seguir para fornecer remédios não oferecidos pelo SUS. O paciente precisa de um laudo médico e de um comprovante de que não pode pagar pelo medicamento, que, por sua vez, deve ter registro na Anvisa.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu anteontem um “caminho das pedras” para quem deseja entrar com uma ação judicial porque não encontra um medicamento importante no Sistema Único de Saúde (SUS). As medidas determinadas podem contribuir para que pessoas com menor condição financeira obtenham os remédios necessários para sua terapia.
Os critérios estabelecidos são: a existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); um laudo médico que comprove necessidade da droga e a ineficácia dos fármacos já fornecidos pelo SUS; e a comprovação de que o paciente não pode pagar pelo remédio.
Ex-presidente da Academia Brasileira de Medicina, Francisco Sampaio elogia a iniciativa do STJ, mas recomenda cautela na avaliação dos casos que chegam à Justiça:
— Vemos muitas pessoas que não têm condições para bancar seu tratamento. A população deve ter mecanismos para obter os medicamentos pelo SUS, mas defendo que cada atestado seja avaliado por três médicos (no processo judicial), para evitar a criação de um esquema que beneficie a indústria farmacêutica — pondera. — Hoje, o SUS incorpora remédios à sua rede com uma velocidade satisfatória, e investe muito no descarte de remédios que não têm procedência confiável.
Para Ligia Bahia, médica e professora da UFRJ, a definição dos critérios realizada pelo STJ pouco muda o que já vinha sendo exigido nos tribunais. Ela avalia que o excesso de ações judiciais relacionadas à saúde não deve ser visto como algo positivo, porque, em geral, o acesso ao sistema Judiciário ocorre por pessoas que têm instrução e são de uma camada social de maior renda.
— Os três critérios definidos agora pelo STJ já são os adotados, na prática, em boa parte das ações. É assim que funciona atualmente, então acredito que essa nova resolução seja apenas uma reiteração — argumenta. — O melhor caminho para a população não é fortalecer a via judicial, porque nem todas as pessoas têm acesso ao Judiciário. O acesso à saúde continua não sendo universal.
A médica recomenda que a incorporação de remédios seja mais rápida e transparente.
— É isso o que vai, de fato, ser um benefício permanente para a população. — avalia a médica. — A judicialização é um típico problema de gestão. O STJ está tomando uma atribuição que não é dele, mas do Ministério da Saúde.
DOENÇAS RARAS Para quem sofre de alguma doença para a qual não existe opção de medicamento já registrado pela Anvisa, o receio é de que a nova resolução do STJ impeça, de uma vez por todas, qualquer tentativa de se obter o remédio em questão.
Diretora jurídica do Instituto Vidas Raras, Amira Awada explica que, como boa parte dos remédios para doenças classificadas como raras não é registrada na Anvisa, muitos pacientes nem sequer terão chance de entrar com uma ação na Justiça, porque não cumprirão os requisitos mínimos fixados pelo STJ.
Na avaliação de Amira, a resolução é contrária a decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal (STF), que não criaram impedimentos para pacientes que precisam de remédios ainda sem registro no país.
— Muitos (pacientes com doenças raras) serão prejudicados, porque a ação nem será analisada pelo juiz se não cumprir os três requisitos mínimos estabelecidos pelo STJ, e, em muitos casos, o paciente com doença rara só tem chance de tratamento com um único remédio que não está registrado.
CASO JULGADO ERA DE GLAUCOMA O julgamento do STJ, concluído na Primeira Seção no tribunal, tratou de um caso em particular, o de uma mulher diagnosticada com glaucoma que apresentou laudo médico comprovando a necessidade do uso de dois colírios não especificados na lista de fornecimento gratuito pelo SUS. O pedido foi acolhido em primeira e segunda instâncias e mantido pelo tribunal.
Os novos critérios estabelecidos pelo STJ só serão exigidos nos processos apresentados a partir de agora, e não influenciam casos antigos.
Ainda de acordo com a decisão, após o trânsito em julgado de cada processo, o Ministério da Saúde e a Comissão Nacional de Tecnologias do SUS (Conitec) devem ser comunicados para que realizem estudos quanto à viabilidade de incorporação do medicamento pleiteado no âmbito do SUS.
Fonte: O Globo